10 anos de Instagram

Há um tempinho eu estava conversando com uma amiga sobre uma influenciadora que nós seguimos e amamos, e minha amiga frisou e enfatizou algumas vezes nessa conversa de como a vida dela mudou em apenas 3 anos de Instagram: “Você viu a casa dela?” disse minha amiga. Pergunta que respondi com três áudios.

O Instagram começou com a proposta de ser uma rede social visual. De compartilhamento de fotos e micro vídeos de 15 segundos. Ao clicar no “+” para adicionar um conteúdo, se abria a câmera do celular. Fotos e vídeos instantâneos, a vida acontecendo ao vivo e em ordem cronológica. Esse era o Insta, que hoje não é mais.

Essa proposta de um álbum instantâneo e on-line da vida criou a fantasia de que tudo deve ser postado, tudo deve ser exposto, exibido na eterna busca de validação da existência humana.

Ao longo dos anos a plataforma foi sendo moldada pelos usuários e pelo mercado, se transformando nesse imenso Megazord de recursos e ferramenta de negócios que é hoje.

Sempre bom lembrar que dentro dos sistemas vigentes na sociedade, tudo que é gratuito o produto é você.

Bom, eu só tive acesso à informação quando tive um computador com internet na minha casa em 2013, aos 28 anos de idade. Eu migrei para dentro das redes sociais já na minha vida adulta, e sinceramente, eu não consigo imaginar como deve ser a vida de um jovem que cresce se comparando - em um rolar de feed - com centenas de pessoas em poses estratégicas, corpos editados (virtualmente ou cirurgicamente) e vidas aparentemente perfeitas, que seguem o checklist do conceito de sucesso que o sistema capitalista conservador prega: Conquistar casa, carro, viagens, amor antes dos 30 anos e por conta própria. Como se não vivêssemos numa sociedade e para conquistar tudo isso sendo tão jovem não fosse necessária uma estrutura familiar.

Eu também já me comparei muito com pessoas que têm o mesmo enfrentamento que eu, e por esse mesmo motivo também sou comparada. Como se fôssemos uma massa de bolo e partíssemos todos do mesmo local, com o mesmo pensamento, sentimento e mesmas oportunidades na vida.

Tem muita gente que acha que internet é esse local mágico e democrático intocado pelas problemáticas do mundo, onde todos podem fazer e ser quem quiserem ser, mas esse descolamento de realidade vai ficar para um outro texto.

A culpa não é do Instagram, aliás, a tecnologia está aí a favor do bem para quem quer usá-la para o bem e para o mal para quem sonha que as coisas voltem a ser como eram décadas atrás.

As redes sociais ajudaram muito na distorção das relações humanas. Chegando ao ponto de se confundir “on-line” com disponível, de supor bem-estar a alguém por apenas postar stories e chegando ao ápice de existir várias formas de interações egóicas que chamam de flerte. Vários tipos de não relacionamentos onde ninguém se vê e nem se encontra mais. O ser humano vem hipervalorizando a solitude da sua ilha de solidão, onde o único relacionamento que tem é com o mar de algoritmos que só mostram mais do mesmo.

Deve ser difícil lidar com uma pessoa ao vivo que tem ideias próprias, que não diverte na mesma proporção que alguns minutos de rede social e não se pode mutar, rolar para cima ou para o lado, remover ou excluir.

Esse mês eu completo 10 anos de Instagram. E foi nesses espaços que construí para a minha voz que eu fiz quase todos os amigos e amigas que tenho hoje através dos meus textos e do meu ativismo.  

Aprendi na prática sobre marketing de influência e várias profissões na área de comunicação e mídias. Trabalhei nos bastidores para várias pessoas. Dias roteirizados, stories, posts, a vida toda planejada e tudo para parecer natural e orgânico. Cada nova coisa que eu aprendia, eu entendia o quanto as pessoas são manipuladas, o quanto se interpretam personas, reforçam estereótipos e performam uma rotina. Tudo em nome de números: Curtidas, seguidores, engajamento, o viral dos sonhos para mudar de vida do dia para a noite. Muitas vezes sem qualquer ética e/ou responsabilidade sobre o que se posta.

As blogueiras se tornaram influenciadoras, depois criadoras de conteúdo, personalidades da internet e por fim artistas e empresárias. Quase sempre nessa ordem.

E eu nisso tudo? Eu continuo pobre. kkkkk

De 2015 a 2021 tive uma página de ativismo cujo apoia-se continua ativo. Eu me dedicava a criação de conteúdo, ler e estudar sobre pautas sociais. Mas, a exclusão da minha página em julho de 2021 me fez repensar toda minha trajetória.  Principalmente o quanto de mim eu investia tendo apenas um retorno financeiro que não me permitia me movimentar para além do menos que o básico. Ou seja, muitos apoiadores me queriam os servindo, mas jamais conquistando. Eu refiz meus currículos e comecei a procurar emprego. Afinal, de que adiantaria toda essa bagagem de estudos num país fanático religioso, analfabeto político que flerta com a revogação da lei áurea a todo instante? De que adiantaria todo esse conhecimento nessas plataformas que louvam a idiotice, que alçam a pedestais qualquer participante de reality, que marcas fecham contratam milionários com quem tem apenas números, independentemente de serem negativos ou positivos?

De que adiantaria?

Daí você pode pensar: “Ah, mas você lançou três livros” Sim, nos últimos 3 anos. Dois como coautora e uma adaptação de roteiro.

E foi no Instagram que conheci o Leandro Assis que me deu a primeira oportunidade de trabalhar com minha intelectualidade.

Segundo o Censo de 2022, apenas 16% da população adulta tem o hábito da leitura no Brasil. Para um escritor viver apenas de suas obras seria necessário escrever vários livros por ano, inscrever-las em editais do governo, participar de todo e qualquer evento de leitura no país para vender o máximo para receber das editoras o pagamento semestral de percentual de vendas.

Foi amargo esse processo de luto da minha página, ainda o é. Página que criei no auge das minhas ideações suicidas por não enxergar nenhum sentido na minha existência. Fiz o meu e no meu cantinho. Sem Q.I., nem contatos, nem puxa-saquismos. Um crescimento lento e 100% orgânico. Sofri múltiplas ameaças de morte, vários anos de ataques de ódio, colecionei boletins de ocorrência e fui hackeada duas vezes.

Pouquíssimas mãos foram estendidas para mim ao longo dessa década. Hoje eu adoraria um Q.I. porque eu estou cansada. Cansada de observar os mesmos padrões, os mesmos ciclos viciosos que nos mantém no mesmo lugar. Cansada de lutar pelas mesmas coisas e por minha sobrevivência. Cansada de ver pessoas com os mesmos ideais que eu desistir. E na esquina dos meus 40 anos, ainda sonhando com o básico do básico, com uma vida tranquila, com paz.

Cansada e resistindo, porém, cansada de resistir.

Mas voltando ao início do texto, a influencer que mudou sua vida em poucos anos expôs vários aspectos de sua vida e muitas das dificuldades que passava com o marido e os filhos. Uma superexposição que é consumida no Instagram como um reality show. Que bom que deu tudo certo para ela. Continuo acompanhando e torcendo por suas conquistas. Exposição é o dado que eu me recuso a jogar nessa roleta do mercado de influência.

Até 2018 meu perfil era privado e com pouco mais de 5 mil seguidores aprovados manualmente. Eu permaneço pois sei que minha presença é necessária nesses locais, não porque eu indivíduo seja importante, mas tudo que eu represento é. Sabotá-lo, ainda que com razão, seria o prêmio para o rolo de compressor de gente preta que opera em todas as esferas.

No mês de maio eu tive um problema de saúde. Fiquei muito mal. Passei dias inteiros de cama. Ninguém soube porque eu não postei nada em lugar algum. Tive uma crise de ansiedade pensando no pior diagnóstico. Gastei um dinheiro que eu não tinha para fazer exames. Essa mesma amiga que veio falando da influencer sempre diz que eu não reclamo de nada, que eu não apareço para dar uma reclamadinha, mesmo coberta de motivos pra isso. Ora pois, exposição para pessoas como eu significa lidar com gente que se alimenta da pornografia da dor. Pessoas que fazem do sofrimento alheio seu entretenimento. Que se incomodam com uma viagem a trabalho, uma bolo de aniversário e/ou um prato com camarão.

Instagram não é vida real. A vida continua acontecendo mesmo quando não é postada.

Sabemos que para sobreviver ao sistema temos que lidar com o fato de que muitas vezes vamos ter que nos dobrar a ele. Mas nos dobrar até a mostrar a bunda ou até vomitar valores e princípios?

Por aqui eu sigo acreditando que a árvore faz o barulho dela e foda-se se alguém escutou.

 

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